O besouro casca-dura

               Havia na Floresta Maravilhosa uma flor vermelha, que era a casa de um besouro preguiçoso. Quando amanhecia e todos os bichinhos começavam a trabalhar, o besouro virava-se de um lado para outro, dava um bocejo, soltava um “zum-zum” muito rouco e dormia, novamente. Na floresta, era um verdadeiro escândalo sua vidinha ociosa. Não lhe servia de lição ver passar por sua casa centenas de formiguinhas trabalhadoras, as quais, numa fila perfeita, encaminhavam-se para o serviço, todas de enxadinha ao ombro, cantando; nem o bordado de Dona Aranha, sempre preocupada em melhorar sua complicada teia  pendurada em dois galhos de uma bananeira. O que desejava o Besouro Casca-Dura era, mesmo, dormir....Quando a fome apertava, descia ele, pesadão, de sua linda casa vermelha e, sem esforço nenhum, colhia algumas folhinhas macias das plantas que estavam ali por perto e comia, comia, comia...Depois, voltava ao lar e tirava uma  boa soneca.

            Ora, em uma noite muito estrelada aconteceu que, de repente, o besouro foi acordado por uma forte toque de corneta.

            “Que barulho! O que há?”- pensou ele, abrindo os olhos. E, nesse momento, ouviu a voz de um grilo, que anunciava:

            -Venham! Venham todos! Vamos comemorar o aniversario da nossa pátria, a Floresta Maravilhosa! Venham! Depressa!

            “Ora, exclamou o Besouro Casca-Dura, espreguiçando-se. Não vou dar-me ao trabalho de sair da minha caminha para assistir a festa!”. E voltou a dormir.

            Mas, os outros bichos, grandes e pequenos, atenderam ao convite. A festa seria realizada em uma grande gruta. Milhões de vaga-lumes forravam o teto da gruta como se fossem estrelas a derramar fachos de luz. Os bichos, muito alegres, iam entrando, contentes. Ondas de perfume de fores silvestres inundavam o ambiente. E a orquestra de pássaros começou a tocar musicas lindíssimas.

            A festa abrilhantou-se ainda mais com o número dos macacos acrobatas. Piruetas, cambalhotas e alguns tombos no chão arrancavam gargalhadas e aplausos da enorme assistência. Veio, depois, o número das onças e da coelhinha bailarina, que dançava sobre duas patinhas, apoiadas no dorso de duas onças pintadas. Alva, tão alva quanto a neve, com dois olhinhos cor-de-rosa, a coelhinha pulava, rodopiava, executando os mais lindos passos de bailado.

            A bicharada batia palmas. E os fachos de luz dos vaga-lumes se cruzavam, tentando focalizar os três palestrantes. E, assim, foi se desenrolando a linda festa de aniversário da floresta; festa que entrou pelas noites, alegrando aqueles ingênuos bichinhos até os primeiros clarões da madrugada.

            O Besouro Casca-Dura, entregue a sua preguiça crônica, viva perdendo espetáculos como o do aniversário da Floresta Maravilhosa.

            Não saia quase de casa, não trabalhava, não pensava na vida. Vadio, o que ele queria era dormir, dormir, dormir...

            Aconteceu, porém,  em certo dia, que um grupo de formigas saúvas resolvera construir um novo formigueiro. Lugar para isso é que estava difícil de ser encontrado. Procura daqui, procura dali, e a escolha caiu num lugar limpinho que ficava perto da casa de Casca-Dura. E as formigas iniciaram seu trabalho de construção....Serra que serra, bate que bate, e naquele mesmo lugar foi aparecendo uma elevação, base da nova residência das senhoras formigas.

            Um mês depois, já a casa do Besouro Casca-Dura ficava lá em baixo, enquanto o formigueiro se erguia, cada vez mais majestoso.

            Parece impossível, inacreditável, mesmo, mas a verdade é que o besouro nada percebeu! Quando ele saia de casa (sempre sonolento) mal alcançava os olhos em redor de si; e,  por isso mesmo, não viu a construção nova!

            O tempo passava. E eis que um belo dia, um tamanduá (o grande devorador de formigas) resolveu caçar, ali por perto, pois estava desesperado de fome.

            As formigas (coitadas!) nem ao menos puderam fugir...Iam sendo engolidas, as dezenas! Na sua fúria, o faminto tamanduá, de repente, enlaçou com a sua comprida língua a casa do Besouro Casca-Dura e ....lá se foram  a casa e o besouro para o seu papo.

            Desse modo triste, pagou o nosso Besouro Casca-Dura a imprudência de viver dormindo e comendo, comendo e dormindo, o dia todo, todo o dia...

            Mas, a alma dos animais, como a do homem, não morre! E, assim, a alma do besouro, saída da dura casca, que era seu corpo, foi para o mundo espiritual e ficou um bom tempo sofrendo numa região ruim chamada umbral. Porém certo dia, um espírito iluminado foi ao seu encontro e lhe disse:

            - Então, meu filho, o que há com você? Pela cor do seu corpo espiritual, ou seja, de seu perispírito, que está um pouco preto, vejo que não aproveitou as lições da Terra. Que andou você fazendo, quando vivia na floresta?

            Casca-Dura, vendo que não podia mentir, respondeu, envergonhado:

            - Eu....eu...eu andei dormindo muito, mas me ajuda, não quero mais ficar aqui!

            - Ah, vê-se logo, disse o besourão, sacudindo a cabeça. Nunca trabalhou e nunca fez o Bem, não é assim? Pois, senhor Casca-Dura, só podem entrar nesta colônia espiritual besouros que não seja dorminhocos.... Besouro Casca Dura, só entrará aqui neste local agradável de se viver depois de aprender a trabalhar mais e a comer menos. Portanto, venha comigo e aceite um conselho: trabalhe e faça o Bem ao próximo! Evolua! Você deverá voltar para a  floresta e não perca mais tempo!

            O Besouro Casca-Dura só teve tempo de dizer sim, pois, de repente, não enxergou mais nada...E, quase naquele mesmo instante, nasceu na floresta um besourinho, muito pretinho, que logo recebeu o apelido de “Casca-Durinha”. E o besourinho só pensava em trabalhar, trabalhar! Mas, porque ele trabalhava tanto, assim, ninguém sabia....

(Iracema Sapucaia. O besouro casca-dura)

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