Chico Xavier contou a seguinte história:
"Certa vez, alguém me contou que havia sido perseguido e injuriado, por muitos anos, por um ferrenho adversário de suas ideias. Ele vivia sonhando com o dia em que o seu opositor, reconhecendo os equívocos cometidos, o procurasse para pedir perdão... Imaginava, finalmente, ter o referido adversário aos seus pés, dando a mão à palmatória. Acalentara essa ideia de triunfo em que justiça lhe seria feita. Pois bem. Quando já estava com os cabelos quase todos brancos, o adversário de muito tempo, também de cabelos brancos, inesperadamente o procura para o tão aguardado entendimento. Confessou-lhe os seus excessos, pediu a ele que o desculpasse na inveja e no ciúme que sempre o haviam motivado no combate acirrado, falou de suas lutas pessoais e conflitos de ordem íntima semelhantes aos que exatamente criticara no companheiro... Conversaram longamente, sem ninguém por perto para testemunhar o diálogo. O amigo injuriado, que tinha tantas respostas na ponta da língua, que havia decorado o que dizer justamente para quando chegasse a hora inevitável daquele confronto, percebeu, segundo ele próprio me confidenciou, que ele também inutilmente perdera tempo... De repente, sentiu que não havia qualquer razão para o revide... Ambos haviam envelhecido naquela disputa que ninguém saberia identificar como teria começado.
— “Chico — disse-me ele —, eu não tive vontade nenhuma de reagir; é verdade que ele se prevalecera de todas as artimanhas para me prejudicar, mas eu também mentalizara aquele momento, o dia em que, face a face comigo, ele se sentisse humilhado... Ele estava tendo a grandeza de me pedir perdão; se eu não o perdoasse, ele estaria triunfando sobre mim... Eu nunca teria ido a ele; ele é que estava tomando a iniciativa de vir a mim... Eu, que anelava fazer uma publicação no jornal, tornando pública aquela hora de retratação, não tive ânimo de contar isso a quem quer que fosse; você é a primeira pessoa que está sabendo — ele desencarnou há mais de um mês!... Hoje, sinto por ele uma afeição que não sei explicar. Reconheci que em muita coisa ele tinha razão a meu respeito...”
Feliz daquele que, na hora de dar o troco, perde a vontade! Esses encontros com os nossos desafetos mais cedo ou mais tarde acontecerão; se não for nesta vida, será na Vida Espiritual. Os que nos perseguem, com razão ou sem razão, nos auxiliam a identificar o nosso próprio lugar... Às vezes, nos é muito mais útil um adversário sincero que um amigo bajulador."
(O Evangelho de Chico Xavier. Item 31 -O amigo injuriado. Carlos A. Baccelli)