Na noite seguinte, dona Lina continuou a história do seguinte modo:
— Enquanto Jesus crescia, houve vários acontecimentos que mudaram os governos do mundo daquele tempo. Augusto, o imperador Romano, sob o qual Jesus nascera, tinha morrido; em seu lugar estava Tibério César. A Judéia era governada por um procurador Romano chamado Pôncio Pilatos; a Galiléia, por Herodes...
— O quê! exclamou Joaninha.
— Tranqüilize-se, disse dona Lina. Este Herodes era filho daquele que vocês já conhecem; por morte de seu pai, o reino foi dividido e tocou-lhe a parte da Galiléia e da Pérsia; seu irmão Filipe ficou com as províncias da Ituréia e de Traconites; e Lisânias, com a de Abilina. Em Jerusalém governavam o templo os grandes sacerdotes, Anãs e Caifás.
Foi quando apareceu no deserto João, filho de Zacarias, um dos maiores profetas que o mundo teve; sua missão era de preparar o povo para receber Jesus. A vida de João era muito simples; inteiramente entregue ao trabalho de anunciar a vinda de Jesus, não se importou com as coisas da Terra, e assim não possuía nada, a não ser uma pele de camelo com a qual se vestia, e uma cinta de couro para prendê-la ao corpo; alimentava-se de gafanhotos e de mel silvestre.
— De gafanhotos, dona Lina! exclamou o Roberto.
— Sim; eram insetos abundantes naquelas paragens e muita gente os comia. E o mel silvestre, João o achava nas fendas dos rochedos, ou nos arbustos que havia por ali, fabricado pelas abelhas do mato.
— Eu conheço gente que come tanajuras, falou Joaninha. Nossa lavadeira disse que torradas com sal são gostosas.
- A humanidade sempre comeu de tudo, querida. João percorria as margens do rio Jordão, transmitindo as mensagens que recebia do mundo espiritual, porque ele era um profeta muito bem inspirado. E dizia:
— “Eu sou a voz do que clama no deserto. Aparelhem o caminho do Senhor, façam direitas as suas veredas. Arrependam-se do mal que vocês fizeram, e assim poderão ver o Salvador enviado por Deus”.
E muitas outras coisas falava ele ao povo que acorria para vê-lo. Aos que lhe perguntavam o que deviam fazer, respondia:
— “Quem tiver duas roupas dê uma ao que não tem nenhuma; e quem tiver o que comer, reparta com quem não tem”.
— Esse de quem você está falando é João Batista, não é, Lina? perguntou dona Leonor.
— Sim, titia. Chamavam-no de João Batista porque ele batizava quem se arrependia de seus pecados nas águas do rio Jordão. Logo o povo pensou que ele fosse o Cristo mas ele declarou que não; depois dele é que viria o Cristo, do qual ele não era digno nem mesmo de desatar a correia das sandálias. Vieram também a ele os publicanos, que eram os cobradores dos impostos, e lhe perguntaram o que deviam fazer.
— Os publicanos eram os fiscais daquele tempo, explicou o sr. Antônio.
— Mais ou menos, titio. E João lhes respondeu que não deviam cobrar mais do que fosse realmente justo. Um grupo de soldados também foi ter com ele, fizeram-lhe a mesma pergunta e a resposta foi que não maltratassem ninguém, não oprimissem pessoa alguma e que se dessem por contentes com seu soldo.
Como vocês estão vendo, para todos João tinha uma palavra boa e um conselho amigo. Por algum tempo João continuou com suas pregações anunciando a vinda de Jesus e exortando o povo a fazer o bem. Até que um dia ele soube que Herodes se tinha comportado muito mal e chamou-lhe a atenção. Herodes em vez de se corrigir, ficou furioso e mandou prender João e trancá-lo num cárcere.
— Coitado! exclamou Joaninha. E não saiu mais de lá?
— Não; contudo o encontraremos mais tarde. Porém antes de João ser preso, Jesus também esteve com ele nas margens do rio. João o reconheceu e ouviu uma voz que vinha do alto dos céus, que dizia:
— “Este é o meu filho especialmente amado; nele tenho posto toda minha complacência”.
— Quem falou isso, dona Lina? perguntou o João André.
— Eram palavras de um hino de glória que os anjos celestes entoavam em louvor de Jesus.
Nisto o relógio da sala bateu oito horas. Levantamo-nos, desejamos boa noite a todos e fomos para casa.
(O Evangelho da Meninada. Eliseu Rigonatti)