Havia, numa cidadezinha da Palestina, um juiz que não respeitava nem Deus nem os homens.
Em lugar de dar o bom exemplo, honrando a posição que ocupava, esse juiz zombava de tudo que se referisse às coisas de Deus. Declarava-se ateu e não respeitava as crenças alheias.
Era também injusto nos seus julgamentos. Não procedia corretamente nem no tribunal nem no lar. Era um homem desleal nos seus pareceres e sem bondade para com aqueles que o procuravam, cheios de confiança. O maldoso juiz não tinha boa vontade para atender a ninguém. Muitas vezes mandava dizer que não estava em casa, quando pessoas pobres iam ao seu encontro. Se estava no tribunal, era sempre com má vontade e indelicadeza que atendia os que se aproximavam dele; depois de muito esperarem, era quase certo receberem do juiz um “não” às súplicas mais comoventes e aos pedidos mais justos.
Vivia também nessa cidade uma pobre viuva. Era muito doente e tinha dois filhos menores, que haviam nascido defeituosos. Seu marido, morto num desastre, lhe havia deixado uma pequena casa e uma pequena propriedade numa aldeia próxima. Infelizmente, o sócio de seu esposo era um homem desonesto. E agora, vendo que a pobre mulher, doente e abatida, tendo de cuidar dos filhinhos enfermos, não poderia dirigir a pequena propriedade, o sócio cobiçoso tomou conta das terras, dizendo a todos que comprara aquela propriedade da viúva.
A pobre mulher foi ao encontro do antigo amigo de seu esposo e pediu-lhe que não lhe tirasse aquele pedaço de terra, que era a única fonte de sustento para ela e seus filhinhos doentes. Mas, o homem, duro de coração, não quis atendê-la. E ainda zombou dela.
A viúva resolveu, então, apelar para o juiz.
Todos lhe diziam que era inútil, que o juiz não atendia aos pobres... Ela, porém, não desanimou. Foi à casa do magistrado. Um servo veio dizer que o juiz não estava em casa. Não era verdade isso, pois, ela o vira,minutos antes, à sombra de uma videira, no horto de sua casa.
Humilhada e triste, voltou para o lar, para junto dos filhinhos. Não desanimou, porém. No dia seguinte, retornou à casa do juiz. Outra mentira, e ela não foi recebida. Voltou muitas vezes. Muitas outras o procurou no tribunal, até que, um dia, pôde dizer-lhe:
— Senhor Juiz, faze-me justiça, pois o sócio de meu falecido esposo se apossou da propriedade que me pertence e que é o sustento de meus filhinhos.
Defende-me do meu adversário...
O juiz prometeu intervir junto do sócio desonesto, mas, nada fez. Outra vez, e mais outra, e várias outras, a viúva incansável procurou o juiz, rogando-lhe que lhe fizesse justiça.
O magistrado estava imensamente aborrecido com aquelas constantes visitas da viúva. Ela o procurava no tribunal e em casa, sempre com o mesmo pedido: “Faze-me justiça contra meu adversário, Senhor Juiz!”
Por fim, ele disse a si mesmo: “Eu não temo a Deus, nem respeito os homens. Mas, essa viúva não me dá sossego, sempre a importunar-me com o mesmo pedido, sempre a suplicar-me justiça... Bem, eu não dou valor à justiça, nem me incomodo com as misérias alheias... mas, para que essa mulher não mais me aborreça, vou fazer-lhe justiça. ..“
E mandou um oficial chamar o homem desonesto. Verificou, conforme a viúva lhe dissera, que ele não tinha direito às terras. Devolveu a propriedade e as plantações à pobre mulher, fazendo-lhe, assim, justiça, para felicidade dela e das pobres crianças.
(Histórias que Jesus contou. Cap. 14. Clóvis Tavares)